A cada 1 milhão de brasileiros, menos de 20 são doadores de órgãos, de acordo com a Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos (ADOTE). Em países reconhecidos mundialmente como referência nesta área, como a Espanha, este número chega a dobrar. Dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) mostram ainda que, em setembro de 2022, mais de 59 mil pessoas esperavam por um órgão, número que poderia ser menor caso o número de transplantes não tivesse sofrido diminuições durante a pandemia da Covid-19.
Com o intuito de analisar aspectos relacionados à queda no número deste procedimento, o Laboratório de Ciências de Dados e Análise Preditiva em Saúde (LabData), que funciona dentro do Departamento de Gestão de Atividades Acadêmicas (DGAA) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (HCFMB), publicou recentemente um estudo avaliando quais seriam as regiões com maior concentração de transplantes, os possíveis episódios de rejeição e as respectivas consequências destes fatores para o cenário assistencial.
As análises foram realizadas a partir da utilização de inteligência artificial e do conceito de machine learning (aprendizado de máquina), sistema que pode modificar o seu comportamento de forma autônoma tendo, como base, a sua própria experiência, a partir do estabelecimento de regras lógicas geradas com o reconhecimento de padrões dentro dos dados analisados.
Segundo o coordenador do LabData do HCFMB, Dr. Luis Gustavo Modelli de Andrade, a partir da constatação da redução do número de transplantes no Brasil, havia a hipótese de um aumento do número dos episódios de rejeição nos transplantes de órgãos sólidos, o que foi constatado. “O que fizemos foi testar esta hipótese usando dados publicamente disponíveis do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), obtidos do sistema de internação hospitalar e vinculados à cobrança do procedimento, o que leva a um baixo número de subregistros”.
O médico enfatiza que, entre 2017 e 2018, também houve um maior número de rejeições e, apesar do tipo de estudo elaborado pelo LabData mostrar apenas pontos de associação, algumas hipóteses podem ser consideradas. “Nestes anos, tivemos uma falta de medicamentos no sistema público de saúde. Assim, podemos supor que eventos extremos, como falta de imunossupressores e pandemia, estão relacionados a maiores taxas de rejeição”.
As análises do LabData também mostraram que, durante a pandemia, a redução do número de transplantes aconteceu em caráter mundial, mas que a volta do crescimento dos dados não foi um fenômeno uniforme em todos os países. “Houve uma recuperação mais rápida no número de transplantes nos países de alta renda como EUA e Europa, à medida que surgiram vacinas e foram estabelecidos protocolos durante a pandemia. Por outro lado, no Brasil, o número de transplantes no sistema público de saúde no final de 2021 representou um retrocesso de 6 anos”, afirmou Dr. Modelli.
Para o médico, a publicação dos resultados da análise em periódicos reconhecidos é extremamente importante para a melhor divulgação entre a comunidade científica. “Um dos objetivos do LabData é facilitar a análise e extração de um grande volume de dados, e estamos nos especializando nas tecnologias e conhecimentos necessários para a realização deste trabalho. Acreditamos que novos caminhos podem ser trilhados analisando dados de boa qualidade e já disponíveis publicamente, podendo impactar significativamente as políticas de saúde, beneficiando a sociedade”, finaliza.
Sobre o Laboratório
O Laboratório de Ciência de Dados e Análise Preditiva em Saúde do HCFMB foi instituído em 29 de julho de 2021 e tem, como objetivo principal, auxiliar no desenvolvimento de pesquisa e inovação baseadas em algoritmos de inteligência artificial para melhor decisão em saúde. Além disso, o Laboratório visa oferecer cursos de formação fundamental para profissionais que desejem atuar na área de Machine Learning. Qualquer pesquisador do HCFMB ou pertencente a outro hospital/instituição pode solicitar ajuda ao LabData para realizar suas análises, enviando um e-mail para pesquisadgaa.hcfmb@unesp.br.
Além do médico coordenador Dr. Luis Gustavo Modelli de Andrade, participam do LabData do HCFMB os servidores do DGAA Juliana T. Coneglian de Almeida, Lucas Frederico Arantes e Monica de Paula de Sordi, além do Diretor do CIMED Marcelo Martins e dos alunos Abner Macola Pacheco Barbosa (graduação) e Naila Rocha (pós-graduação). O LabData está localizado no DGAA, que está sob a coordenação geral de Juliana Machado Rúgolo.
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