Câncer é a doença que mais mata crianças no Brasil

O Hospital das Clínicas de Botucatu atendeu, no ano passado, 1524 crianças e adolescentes com câncer

O câncer é considerado por muitos como o mal do século. Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), só em 2015 foram, aproximadamente, 576 mil novos casos da doença no país, e a previsão para o biênio 2016-2017 é de 596 mil novos casos, por ano. No Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (HCFMB), são atendidas cerca de 80 pessoas por dia, sendo em média 18 pacientes na onco-hematologia (trata de neoplasias das células produtoras de sangue, como, por exemplo, as leucemias), 50 pacientes por dia na oncologia clínica (responsável pelo tratamento dos demais tipos de câncer) e 6 a 10 crianças na oncologia pediátrica.

O médico coordenador do setor de Oncologia Clínica do HCFMB, Rafael Gaiolla, comenta que é perceptível o aumento no número de casos de câncer no HCFMB, de maneira geral. “Nos últimos anos temos registrado um aumento no número de casos de pacientes com câncer atendidos no HCFMB, tanto adultos, como crianças. Os motivos para isso são muitos, mas citaria como principais a possibilidade de diagnóstico mais precoce, em reposta aos programas de prevenção municipais, estaduais e federais; o acesso à tecnologia de exames mais modernos e específicos, que possibilitam ao médico maior eficácia diagnóstica; e, quando considerados os cânceres em adultos, o aumento da expectativa de vida, favorecendo o aparecimento de neoplasias associadas ao envelhecimento”, observa.“Temos notado que alguns cânceres que são mais comuns em pacientes mais velhos passaram a ser diagnosticados, com certa frequência, em pacientes muito jovens, entre 20 e 30 anos de idade. Isso se aplica principalmente às neoplasias de mama e de intestino, refletindo aqui a possível influência de exposição ambiental e estilo de vida”, esclarece o especialista

Conforme informações que constam no site do Inca, estima-se que serão diagnosticados, em 2016, por volta de 12.600 canceres infantis em todo o país e, assim como em países desenvolvidos, no Brasil o câncer já representa a primeira causa de morte (7% do total) por doença entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos, para todas as regiões. Gaiolla esclarece que no setor de oncologia pediátrica do HCFMB, o diagnóstico mais frequente é a neoplasia de sistema nervoso central, seguida das leucemias agudas.

O Inca também alega que entre as crianças o índice de cura é maior do que nos adultos, e gira em torno dos 70%, se a doença for diagnosticada precocemente e tratada em centros especializados. Gaiolla explicaporque as crianças têm maior probabilidade de cura. “De forma geral, os cânceres infantis são doenças agressivas, com alta proliferação celular. Isso os torna sensíveis ao tratamento quimioterápico. Dessa forma, em comparação aos cânceres nos adultos, é possível afirmar que as taxas de cura na faixa pediátrica são maiores, embora isso não necessariamente se aplique a todas a doenças neoplásicas. A chance de cura depende uma combinação de aspectos favoráveis e do tipo de neoplasia”, explica.

O especialista também destaca que não há como prevenir a doença na população pediátrica. “Infelizmente não existem meios para prevenir o câncer infantil. Os pais devem ser orientados a realizar exames de rastreamento apenas em casos de cânceres familiares. Nessas situações, é papel do pediatra identificar esses casos e eventualmente encaminhá-los para avaliação do oncologista pediátrico”, salienta. O HCFMB é um dos centros especializados no tratamento de câncer infantil.

O atendimento às crianças com câncer no HCFMB segue um fluxo idêntico ao das outras faixas etárias. Os pacientes que chegam à oncologia pediátrica são encaminhados por outros serviços do Hospital, já com o diagnóstico de neoplasia confirmado por biopsia ou são encaminhados de outros hospitais da região para confirmação diagnóstica. A partir daí, são realizados os chamados exames de estadiamento, que incluem exames laboratoriais e exames de imagem (por exemplo, tomografia e ultrassonografia) para se definir a extensão do acometimento tumoral.Após a confirmação, inicia-se o tratamento, que pode incluir quimioterapia e/ou radioterapia e tem duração variada, dependendo do tipo de câncer. Após o fim do tratamento,a criança volta a repetir exames para verificarsua efetividade. Essas crianças permanecerão em observação médica no ambulatório por tempo indeterminado, mesmo que tenham apresentado desaparecimento do câncer com o tratamento, porque deve-se rever os exames e monitorizar se a doença realmente está controlada.

Histórias de amor e superação

Se para um adulto o diagnóstico de câncer é um momento delicado, para uma criança pode ser um momento muito confuso. É o que explica Pedro de Oliveira (23). Diagnosticado aos 13 anos com Leucemia Linfóide Aguda (LLA), ele relata que, no começo, não entendia muito bem o que estava acontecendo e que tomou conhecimento da gravidade de sua situação com o passar do tempo. “No começo eu não entendia muito bem que estava acontecendo. Tinha acabado o meu ano escolar e comecei a ter problemas de saúde. Tive alguns diagnósticos errados até que a minha perna travou e pediram para fazer um exame de sangue, onde verificaram que eu estava com o número de plaquetas muito elevado. Fiz meu tratamento em São Paulo e me lembro que foi difícil. Comecei a entender que algo estava errado quando tive contato com outros pacientes. Foram dois anos de luta contra a doença, período em que eu e minha mãe sofremos bastante, pois eram muitos medicamentos, muitos cuidados com a higiene que ela teve que ter para tudo correr bem e eu me curar”, relembra.

Oliveira, que hoje leva uma vida normal, fala que os momentos que mais o impactaram durante o tratamento foram sua perda de peso e quando seu cabelo começou a cair. Ele é categórico ao afirmar que a doença é uma experiência difícil e única. “A pessoa só consegue entender a dimensão do que é ter câncer ao passar por essa experiência. Posso dizer que enxergo a vida com outros olhos, afinal superei a doença. Eu continuo anualmente fazendo acompanhamento e percebo que os médicos ficam felizes em me ver bem, em ter superado a doença e hoje ser um rapaz saudável. Posso ir para a praia, tomar sol, beber uma cerveja, como qualquer outra pessoa”, comemora.

Para a mãe que tem um filho com câncer, o impacto é grande ao saber da notícia. Sueli Botaro (49), mãe de Pedro Botaro (17), que faz tratamento no HCFMB contra tumor no osso do joelho, explica como se sentiu ao saber da notícia. “Ficamos perdidos, porque o choque do início, ao saber da doença e de como seria o tratamento, é muito complicado. Tem horas que queremos desabafar, chorar, eprecisamos de apoio. O Pedro está em tratamento há mais ou menos um ano e passou por uma cirurgia e sessões de quimioterapia. Agora,ele vai fazer uma avaliação para ver como reagiu ao tratamento. Temos muito a agradecer a equipe médica, que foi excelente”, relata.