Setembro Verde: o amor que se multiplica

Uma ligação que muda destinos e reacende sonhos. Uma espera que faz parte da rotina de milhares de pessoas em todo o Brasil que aguardam por um transplante. Nesta quarta-feira, 27 de setembro, é lembrado o Dia Nacional do Doador de Órgãos, instituído em 2007 com o objetivo de conscientizar a população deste gesto que pode salvar, em média, até 8 vidas.

Dados da Revista Brasileira de Transplantes (RBT) mostram que, no primeiro semestre de 2023, mais de 58 mil pessoas estavam esperando por um órgão no Brasil e cerca de 11,6 mil transplantes foram realizados.

O que pode ser doado?

Alguns órgãos podem ser doados em vida, como um dos rins, parte do fígado, do pulmão ou da medula óssea, bem como o sangue, caracterizado como um tipo especial de tecido. Por sua vez, quando o paciente é diagnosticado com morte encefálica (ou seja, sem atividade cerebral), mas ainda com funções cardíacas ativas, podem ser captados alguns órgãos: pulmão, fígado, rins e pâncreas, além do próprio coração. Pele, ossos e córneas podem ser disponibilizados para transplante depois que já não houver atividade cardíaca.

Normalmente, o diagnóstico de morte encefálica é finalizado em torno de 6 horas. Com a aprovação da família ou responsáveis legais, os órgãos são captados e posteriormente mantidos em uma solução conservadora, podendo esperar certo período de tempo para serem transplantados. Os rins, por exemplo, podem ser mantidos por 36 horas; a córnea pode permanecer por até 14 dias até ser transplantada; já o coração e o pulmão não podem ficar mais de 4 horas fora de outro corpo humano.

Serviços especializados no HCFMB

No Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (HCFMB), o Núcleo de Procura de Órgãos e Tecidos é composto pela Organização de Procura de Órgãos (OPO) e pelo Banco de Olhos de Botucatu (BOB), responsável pela captação de órgãos sólidos (coração, pulmão, fígado, rins) e tecidos (córneas).

O coordenador da OPO do HCFMB, Dr. Laércio Stéfano, destaca que todas as pessoas são doadoras em potencial e que a captação de órgãos passa por vários critérios. “Por conta de idade, doenças prévias ou infecções, nem sempre os órgãos são viáveis para serem transplantados. Porém, até que se comprovem estas situações, todos são considerados aptos à doação”.

Já em relação à captação de córneas, o médico oftalmologista do HCFMB e Diretor Técnico do Banco de Olhos, Dr. Alvio Isao Shiguematsu, reforça que há critérios de exclusão específicos para este procedimento que é o tipo de transplante mais realizado no mundo, com mais de 185 mil procedimentos por ano. “Infecção generalizada, sorologia positiva para os vírus das hepatites B e C, além do HIV, infecções e tumores oculares, linfomas e leucemias podem ser fatores de impedimento da doação. Porém, a princípio, qualquer pessoa entre 2 e 80 anos pode ser um doador de tecidos oculares”.

O maior presente que Pedro poderia receber

Natural de Divinolândia, no interior paulista, Jainara Isabel de Siqueira recebeu uma notícia, em 2017, que mudou completamente a rotina da família: os dois rins de seu filho Pedro, na época com 7 anos, pararam de funcionar por uma causa desconhecida. Com isso, a luta pela vida teve seu início, a mais de 300 km de distância. “Foram 6 meses entre hemodiálise e diálise peritoneal no HCFMB. Meses de dor, sofrimento e de muito medo de perder meu filho. Durante o período de Natal daquele ano, o Pedro foi ao shopping e pediu ao Papai Noel um rim. A sensação de não poder fazer nada para ajudar é desesperadora”, relata Jainara.

Quase cinco meses depois, o presente tão aguardado chegou. “No dia 12 de abril de 2018, recebi a ligação que mudou nossas vidas. Foi uma mistura de alegria pela vida do Pedro e uma dor imensa por saber que, naquele momento, uma mãe estava em luto. Da forma mais linda e dolorosa, Deus nos presenteou com um milagre”.

O transplante foi realizado no dia seguinte e, após cinco anos, Jainara se emociona ao se lembrar desta trajetória e de todos os envolvidos. “O Pedro recebeu o melhor tratamento, com os melhores profissionais, e sou eternamente grata a Deus e a toda equipe que participou deste processo, pois fazem parte da nossa história. Agradeço também à mãe do doador, que decidiu dar uma parte do tesouro dela para viver dentro do meu filho, dando mais tempo de vida para ele”.

Como doar?

A legislação atualmente em vigor aponta que, mesmo com a decisão individual do doador, a família deve autorizar a doação dos órgãos do paciente em morte encefálica. Já para a doação em vida, é necessário ser maior de idade, cônjuge ou parente do receptor até o quarto grau. A doação para não familiares acontece somente com autorização judicial.

Dr. Laércio reforça que há muitas questões relacionadas ao medo quanto ao diagnóstico de morte encefálica, além de convicções pessoais e religiosas, que impedem a doação de órgãos, mas o grande empecilho ainda é o desconhecimento da família quanto à vontade de seu ente querido. “Nós precisamos nos colocar no lugar de quem espera, por anos, um telefone tocar para receber um transplante. Esta conscientização precisa ser diária e se tornar uma cultura em nossa sociedade”, finaliza.