Para compreender o Projeto de Pesquisa de efetividade da vacina Fiocruz/Oxford/Astrazeneca (e porque você não pode descuidar da covid quando vacinado)

Dr. Carlos Magno Castelo Branco Fortaleza

As vacinas são uma das maiores conquistas da humanidade. Só para se ter uma ideia, as imensas campanhas vacinais realizadas nos anos 1960 permitiram a erradicação mundial completa da varíola, uma doença grave que causava mortes e deformidades. De forma semelhante, o Brasil venceu a pólio na década de 1980. As vacinas reduziram em muito o impacto do sarampo e da febre amarela sobre a população paulista em anos recentes. Todos os anos, evitam que idosos e pessoas com doenças crônicas adoeçam e morram por complicações da gripe.


Pensando em tudo isso, porque há pessoas que ainda hesitam em receber vacinas contra a COVID-19? A resposta é complexa, mas envolve a divulgação de informações falsas em redes sociais, a fala de políticos influentes e a falta de empatia (preocupação com os outros) de parcela significativa da população brasileira.
Nesse sentido, Botucatu vem dando um exemplo ao mundo. O projeto de efetividade que envolveu a vacinação de toda a população adulta do município não somente contou com adesão acima de 95%, mas também permitiu que a cidade demonstrasse a excelência do seu sistema único de saúde, a qualidade científica da universidade e a importância do hospital das clínicas. Hoje, toda a comunidade internacional de “vacinólogos” (pesquisadores na área de imunização) sabe em que ponto do mapa fica nossa cidade. A capacidade de vacinar tantos em tão pouco tempo deixou boquiabertos os cientistas da Universidade de Oxford.


Mais que isso, o projeto vem salvando vidas. Desde o dia 16 de maio, quando foi iniciada a “vacinação em massa”, tivemos redução de cerca de 80% nos casos, mais de 60% nas internações a aproximadamente 50% das mortes. E ficará melhor com a aplicação da segunda dose em 08 de agosto. Porque esses achados são importantes. Tentarei resumir em dois itens: (1) os estudos comuns de vacina (ensaios clínicos) analisaram um grupo mais jovem e saudável que a população geral, então estudos de vida real são necessário mas mostra o que acontece “na prática”, especialmente em relação a novas variantes do coronavírus; (2) nesses ensaios clínicos se analisa só a proteção do vacinado, enquanto em uma aplicação da vacina a toda a população também traz uma proteção coletiva, ou seja, o vírus circula menos e todos ficam mais protegidos.


Fomos então privilegiados por um projeto de pesquisa em prol da saúde da população, que só foi possível pelo esforço heróico do prefeito e do secretário de saúde, pela eficiência da nossa estrutura para vacinação e pelo lastro científico da Faculdade de Medicina e do Hospital das Clínicas de Botucatu. Mas há alguns pontos que merecem atenção.


O primeiro diz respeito a tomar a segunda dose. Ela é extremamente necessária para manutenção e aumento da proteção, e ainda mais diante de possível entrada da nova variante delta do coronavírus. Estudos mostram que contra essa variante a efetividade de uma única dose é pequena, mas duas doses aplicadas fornecem excelente proteção. O segundo é a necessidade de continuar a se manter isolado e usar máscaras, até que a pandemia acabe. Mesmo sendo as vacinas excelentes, elas não protegem 100%. Se voltarmos às aglomerações, reduziremos o impacto da vacinação em massa e faremos com que a COVID-19 demore mais a ser controlada. Essas medidas adicionais se somam às vacinas para evitar mortes.
A cidade tem muito do que se orgulhar. Mas nesse momento é preciso que reconheça a importância do Sistema Único de Saúde (que envolve, lembremos, também o Hospital das Clínicas) e da Universidade Pública e Gratuita. Duas instituições que estão em risco, e que todo o povo brasileiro precisa defender.

Dr. Carlos Magno Castelo Branco Fortaleza é médico infectologista do HCFMB, responsável pelo estudo de efetividade da vacina Oxford/Astrazeneca em Botucatu e membro do Plano de Contingência da Governo do Estado de São Paulo.